27/02/2013

Cultura do "nas coxas"...

Nesta semana, meu amigo Ricardo Roese postou, no Facebook, uma foto do "pier"construído por um empresário no bairro Ipanema, zona sul de P.Alegre. Eu sou morador do bairro e asseguro que a iniciativa do empresário é oportuna. É claro que o "pier" é bastante acanhado, mas atende a necessidade de quem o construiu e ainda sobra algum espaço. Mas, o que chama a minha atenção é que existem muitos atracadouros em P.Alegre, todos particulares, localizados em clubes e sociedades náuticas - ou seja, nenhum é público ou empreendido pelo setor público. E temos um belíssimo cais do porto - na área central, com um ponto de embarque e desembarque de embarcações que fazem passeios turísticos. Local público, mas específico e muito mal feito, muito enjambrado, improvisado.

Eu gosto muito de pedalar na ciclovia em Ipanema. Mas aquela ciclovia é muito ruim. Quando foi instalada era uma novidade, foi a primeira, e faz menos de 25 anos que ela está ali... exatamente igual - inclinada, cheia de calombos, curta e estreita para as necessidades - só que foi pintada. Ou melhor, maquiada. Prioridades... As prioridades são outras. São tantas. Só que nenhuma prioridade é o ser humano, enquanto... humano. Os ônibus ficam modernos e continuam apertados, sem horários e caros. Os táxis são os mesmos 4.000 ou 4.500 de trinta anos atrás. E - neste tempo fomos de um 1 milhão para quase 1,4 milhão de habitantes. O metrô, que já deveria estar pronto, ainda está sendo discutido. A 3a. Perimetral, quando foi inaugurada, já estava esgotada... coitada.

Soube que a frota de táxis do Rio de Janeiro é de 33 mil veículos. O louco nisto é que as autoridades estimam que cerca de 15% desta frota, 4.950 carros, sejam clandestinos. É mole?

Certa vez, em São Paulo, saindo do aeroporto de Congonhas, fui alertado pelo motorista do táxi para fechar os vidros, travar a porta e esconder a pasta porque uns motoqueiros assaltam, desde a chegada dos primeiros vôos, antes das 7h. E mostrou uns motoqueiros com os garupas portando pequenas metralhadoras sob a jaqueta. Muitas vezes a vítima é escolhida já dentro do saguão ou no desembarque, por um quadrilheiro que avisa os bandidos na moto, através de celular. Todos sabem que é assim. Mas ninguém faz nada...

A segurança pública é defendida cada vez com menos policiais. As cadeias são as mesmas, embora os presos tenham dobrado de volume. E ficam lá, amontoados. O salário dos servidores é o mesmo, às vezes, na proporção, menor, em todas as esferas. Só não nos legislativos e nas altas castas do judiciário, é claro.

Aqui na zonal sul, na Av. Coronel Marcos, tem um cano do pluvial que, duas vezes por ano afunda e alaga tudo. Isto acontece já uns oito anos. E a mesma empreiteira vai lá e paralisa tudo, desvia o trânsito e conserta. Sempre o mesmo cano, o mesmo lugar e a mesma empreiteira. Acho que estes caras só fazem esta obra.

Acho que este negócio de dar um jeitinho, uma ajeitadinha nas coisas, esta cultura da tramela e da rebimboca da parafuseta precisa acabar...

A postagem do Ricardinho Roese e esta coluna da Martha Medeiros abaixo, publicada hoje em Zero Hora, me botaram a pensar... e muito...



Zero Hora, 27/02/2013| N° 17356

MARTHA MEDEIROS

  • Infiltrações

    “Aqui tudo parece que é ainda construção, e já é ruína”.

    Conversava com um amigo sobre o vexame que foi a abertura daquele buraco no conduto Álvares Chaves na semana passada, durante um dos temporais mais enérgicos ocorridos em Porto Alegre, e nos veio à lembrança essa parte da letra da música Fora da Ordem, do Caetano Veloso. Não é o caso de tratar desse assunto isoladamente (por mais absurdo que seja o fato de um investimento tão alto numa obra de drenagem resistir apenas quatro anos), mas de analisarmos o contexto todo: vivemos num país maquiado, em que se as coisas “parecerem” benfeitas, já está ótimo.

    A Arena também serviria como exemplo de uma obra entregue às pressas para cumprir calendário, mesmo sem condições básicas de uso. Mas também não pode ser visto como um caso isolado. Há outras tantas em andamento, todas com prazo máximo de 15 meses para serem concluídas (até o início da Copa), e me pergunto: o corre-corre não comprometerá o bom acabamento de viadutos, pontes, prédios e estradas? Com a intenção de viabilizar orçamentos, não se estará sacrificando a qualidade do material empregado? Os funcionários em atividade estão bem preparados ou fazem um serviço matado, a toque de caixa? Dá pra confiar na espinha dorsal do Brasil?

    Há que se ter cuidado com infiltrações. De todos os tipos, aliás. Com a infiltração de inconsequentes em meio a uma torcida, capazes de disparar um artefato com poder destrutivo em direção a outras pessoas, sem levar em conta que o gesto poderá ferir gravemente alguém ou até mesmo matar – como matou o garoto boliviano de 14 anos. Com a infiltração de médicos e enfermeiros sem ética dentro de hospitais, que desligam aparelhos que mantêm vivos os pacientes, a fim de “desentulhar a UTI”. Com a infiltração de políticos desonestos nas entranhas do poder, que mesmo acusados por crimes diversos assumem cargos de presidência de instituições.

    Por fora, bela viola. O Brasil hoje é visto como um país moderno e estável. É uma aposta mundial considerada certeira, um candidato VIP a juntar-se às superpotências. Mas como andará o esqueleto desse país que se declara tão sólido? Na verdade, o Brasil é um jovem com osteoporose precoce, um país descalcificado, que fica em pé à custa de aparências, comprometido com sua imagem pública, mas que segue com uma infraestrutura em frangalhos. Aqui pouco se investe seriamente em educação, em treinamento de pessoal, em qualificação de mão de obra, em fiscalização, em responsabilidade social, tudo o que alicerça de fato uma nação. Nossa mentalidade “espertinha” faz com que não gastemos muito dinheiro com o que fica oculto, com o que não dá para exibir. O resultado? Por dentro, pão bolorento.

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